O primeiro procedimento da história com vista à recuperação de
empresas em dificuldades surgiu em 1867 nos Estados Unidos, denominado Lei
de Companhias Ferroviárias que se propunha assegurar o fortalecimento
dessas companhias, fator primordial do rápido desenvolvimento daquele país.
A seguir, em 1898, através do Bankrupty Act, e bem mais tarde, aprimorado
pelo Chandler Act (1978), o mesmo procedimento ampliou-se para atingir
outras pessoas jurídicas.
No Brasil o sistema
jurídico da insolvência foi instituído em 1945 através do Decreto-Lei
no. 7.661/45, produzido após a segunda grande guerra mundial, refletindo
as coordenadas da nova ordem econômica instaurada a partir da Conferência
de Bretton Woods. O crédito, enfocado pela lei, era uma obrigação, pois
não se dava importância à repercussão da insolvência no mercado, seu
efeito nefasto na sociedade, principalmente, com relação ao fechamento
de postos de trabalho, atendo-se exclusivamente no ajustamento das relações
entre o passivo do devedor e o rol de credores.
Desnecessário salientar
a distância amazônica do referido sistema jurídico com o perfil moderno
das empresas competitivas em economias globalizadas e, da absoluta
necessidade de se manter em funcionamento empresas que criam riquezas,
pagam impostos e empregam muito. A Lei de Falência e Concordata,
verdadeiro labirinto processual a serviço da morosidade, abandonava os créditos
não públicos à própria sorte, criando problemas ao invés de trazer
soluções e, estas, quando em pauta, reforçava a burocracia e quase
sempre se apresentavam inócuas.
As modernas teorias
voltadas ao tema tratam de assegurar o crédito público e o emprego sem,
contudo, abandonar o crédito privado e o equilíbrio das relações do
mercado. Por outro lado, de nada adianta a pura e simples preservação de
uma empresa inviável, pois, o custo aos credores e a toda a sociedade é
por demais alto para a procrastinação de uma morte anunciada.
O resultado
será proveitoso somente quando houver uma simbiose destas duas correntes
aparentemente antagônicas: 1º - a preservação da empresa viável em
dificuldades e; 2º - a extinção da empresa inviável em dificuldades. O
resultado da combinação destas duas posições possibilita a satisfação
que melhor atende aos reclamos da sociedade.
Sob este
clima e esta ótica, foi promulgado a Lei de Recuperação de Empresas
(LRE) que se apresentou ao mundo fático como um diploma multidisciplinar,
pois além de englobar ciências contábeis, administração de empresas e
economia, no plano jurídico abrange direito tributário, direito
trabalhista, direito administrativo e direito penal. Contudo, todo o esforço
legislativo poderá ser em vão, sepultando esperanças de muito
acalentadas, se a lei não pegar.
A LRE, neste
mister foi cuidadosamente elaborada, elencando um rol de práticas
consideradas delituosas e propondo punições pesadas aos infratores com
penas que podem alcançar seis anos de reclusão. Convenhamos que não
poderia ser diferente, pois se a finalidade maior da lei é de recuperar
empresas em dificuldade, toda fraude que impossibilite uma visão clara do
conjunto de fatores problemáticos, desviando ou ocultando a realidade,
resultará em um empecilho intransponível à almejada recuperação.
Neste campo o legislador foi irrepreensível!
Na antiga Lei
de Falência, a possível apuração de fraudes ocorria no próprio juízo
da falência, através do inquérito judicial que transformava o
magistrado em regente da investigação. Na nova lei a investigação
estará a cargo da Polícia Civil, instituição competente para a
instauração do inquérito policial, já que o processo penal correrá no
juízo criminal da comarca em que correr a recuperação ou falência.
O
professor Waldo Fazzio Junior, em sua importante obra sobre a matéria
assevera: "O Inquérito Policial tem importância fundamental no
processo de falência, pois define um quadro de todas as vicissitudes que
explicam a quebra, desde os desmandos e equívocos da conduta do devedor
ou dos administradores da empresa falida até a própria incidência
penal, individualizado, neste caso, os responsáveis e especificando os
eventuais crimes ocorridos".
Nesta
esteira a Polícia Civil está preparada para receber os procedimentos que
advirão e, bem cumprindo sua missão, deverá colaborar de forma
determinante para o sucesso da Lei. No entanto, há de se destacar que a
importância e complexidade da matéria demandam notória especialização,
sem a qual, procedimentos distintos transformam-se em impedimentos a
normatização, pressuposto básico da confiabilidade jurídica.
Considerando-se a especialização dos advogados que militam na área
falimentar, segmento altamente sofisticado, a investigação só terá êxito
se os policiais responsáveis conhecerem todos os meandros da matéria,
fruto de um trabalho exclusivo e dedicado.
04.06..2005 |