Bem de família do fiador - penhora
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ZENO  VELOSO
Jurista
 

                           

       A Editora Atlas, de São Paulo, está publicando uma coleção denominada “Código Civil Comentado”, que terá 21 volumes.

O coordenador da obra é o professor Álvaro Villaça Azevedo e eu sou o autor do volume XVII, já nas livrarias, analisando os artigos 1.694 a 1.783 do Código Civil, que regulam os alimentos, o bem de família, a união estável, a tutela e a curatela.

O bem de família já era tratado nos arts. 70 a 73 do Código Civil de 1916, e o vigente Código Civil se ocupa do assunto a partir do artigo 1.711, que diz: “Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial”.

Esse instituto, objeto do Código Civil, é o bem de família voluntário, convencional, escolhido e eleito pelo interessado, constituído por sua vontade, através de um ato formal; em regra, tem por objeto um prédio residencial urbano ou rural e poderá abranger valores mobiliários. O ato precisa ser registrado no Registro de Imóveis e, em princípio, o bem não pode ser alienado.

Assim como aconteceu durante a vigência do Código Civil revogado, parece que o bem de família convencional, até pela excessiva burocracia, as formalidades, as despesas para sua constituição, continuará sendo muito pouco utilizado em nosso meio.

Mas temos o bem de família legal, que está automaticamente instituído, por força da lei, sem formalidade alguma, e é outro motivo - talvez o principal - para que o bem de família voluntário ou convencional seja uma raridade. Esse bem de família legal vem previsto na Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990, que é de ordem pública e representa um dos mais importantes diplomas normativos em vigor no Brasil. No artigo 1º, dispõe: “O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo as hipóteses previstas nesta lei”

A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados. Mas excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.

O artigo 391 do Código Civil adota o princípio universal e antiquíssimo: “Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor”. Por sua vez, o Código de Processo Civil, artigo 591, adita:

“O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei”. 

Adiante-se, logo, que a regra é a responsabilidade patrimonial, mas há exceções, todavia: os bens inalienáveis e impenhoráveis estão a salvo da execução dos credores. O exemplo mais evidente e notável de um bem que não responde pelas obrigações de seu titular, que não pode ser executado, que é impenhorável, é o bem de família.

O artigo 3º da lei nº 8.009/90, em sete incisos, aponta os casos, excepcionais, em que o imóvel residencial responde por dívidas e, portanto, pode ser penhorado, como por exemplo, em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência, do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, para cobrança de impostos, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar (aqui se enquadra a taxa de condomínio). O inciso VII do artigo 3º menciona a obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Portanto, o imóvel em que reside a pessoa que concedeu fiança em contrato de locação pode ser executado, penhorado, se o locatário não pagar o aluguel. E nem tem direito o pobre do fiador, para escapar do prejuízo, numa ação regressiva, penhorar o bem  de família do locatário, pois esse dito bem - do locatário - segue a regra geral e é impenhorável. O STF já decidiu, várias vezes, e recentemente, que o imóvel residencial do fiador é penhorável (RE 407.688-SP, relator Cezar Peluso; AI-AgR666879/SP, relator Eros Grau).

Ser fiador é ato de amor e de coragem. O fiador é um herói, um sofredor, pode ficar na miséria, perder a sua própria casa. E há milênios sabe-se disso. Na Bíblia (Provérbios, 6), encontramos a advertência contra o servir de fiador: “Filho meu, se ficaste por fiador do teu companheiro e se te empenhaste ao estranho, estás enredado com o que dizem os teus lábios, estão presos com as palavras da tua boca”. O resto do provérbio, sugiro que você leia no próprio Livro Sagrado.            

28.06.2009 

Fonte: Publicado no "O Liberal" 

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