imposto não incide sobre meação |
Zeno Veloso
Jurista
Falei, por telefone, com Euclides de Oliveira, advogado, escritor, professor, especialista em Direito de Família, ex-integrante do Tribunal de Alçada de São Paulo, mestre muito querido. Ele estava em Évora, a linda e histórica cidade portuguesa, tinha acabado de almoçar no famoso restaurante Fialho, e partia para Servilha, na Espanha. Relembramos que, há tempos, dividimos um painel, em simpósio luso-brasileiro que foi realizado no auditório da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Euclides já esteve no Pará, muitas vezes, a convite do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, do qual é um dos membros mais destacados. É um expositor que encanta os auditórios. Pediu-me que desse lembranças a Marta Vinagre Bembom, Haroldo Pinheiro da Silva e Nena Pinheiro, bem como aos colegas que o receberam, em Santarém: Miguel Borghezam, Ubirajara (Bira) Bentes e Jacirene Façanha. Como cidadão honorário de Santarém, mostrei, orgulhoso, algumas belezas de nossa cidade e de nossos rios ao Euclides, que ficou absolutamente fascinado com tudo o que viu, confirmando que Alter do Chão é uma das mais belas praias do mundo, porém, achou ainda mais bonita a praia que fica na ponta do Cururu. Meus saudosos amigos Everaldo Martins, Ubaldo Corrêa e Benedito Guimarães, bem como os caros amigos Paulo Lisboa, Rogério Corrêa (meu bom dentista), Édson Serique, Vicente Malheiros e José Wilson Malheiros (esses dois últimos, filhos do maestro Izoca), sempre me falavam e falam de Santarém, fazendo crescer minha admiração por aquela terra tão querida. Porém, quando eu ainda era estudante, quem despertou em meu coração o amor por Santarém, em conversas inesquecíveis, recheadas de emoção, foi o queridíssimo Cléo Bernardo, um dos maiores pensadores que o Pará já produziu, meu líder, meu mestre. E acabo de utilizar um parecer de Euclides para confirmar a opinião que externei no caso seguinte: Maria da Glória Barata tinha sido casada sob o regime da comunhão universal de bens com José A. Barata, e o casal teve três filhos. Com o falecimento de José, a viúva e os filhos pretendem abrir o inventário e promover a partilha dos bens. O patrimônio total do casal está avaliado em R$1.200.000,00. A família está preocupada com as despesas que terá de arcar, e recebeu a seguinte orientação: se o inventário for judicial, além de outras despesas, terão de pagar a taxa judiciária (a que também se denomina de custas judiciais), bem como o imposto de transmissão “mortis causa”, tendo a taxa judiciária e o aludido imposto como base de cálculo o total dos bens do espólio, o chamado monte-mor, a totalidade dos bens do casal, englobando, portanto, a herança deixada pelo falecido e a meação do cônjuge sobrevivente. Se, por outro lado, o inventário for feito extrajudicialmente, por escritura pública, os emolumentos do tabelião, assim como o imposto de transmissão de propriedade serão cobrados, igualmente, pelo mortemor, incidindo, portanto, sobre a herança do “de cujus” e a meação da viúva. Foi assim que entendeu e achou que devia ser o tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mas o acórdão foi afastado pelo Superior Tribunal de Justiça-STJ (4ª Turma, relator ministro Luís Felipe Salomão), ao julgar o recurso especial 898.294. O professor Euclides de Oliveira, na Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, n° 24, out/nov2011, pági na 114, analisa a questão, com a habitual proficiência, e faz comentários elogiosos à decisão do STJ, que deu provimento ao recurso especial e reformou o entendimento do tribunal gaúcho. Como o espaço, aqui, não permite longas exposições, vou sintetizar: no processo de inventário, a taxa judiciária deve ser calculada sobre o valor dos bens deixados pelo “de cujus”, excluindo-se a meação do cônjuge supérstite (a viúva ou o viúvo). Do mesmo modo, o imposto de transmissão “causa mortis” só incide sobre a herança, não englobando a meação do cônjuge. Não se enquadra no conceito de herança a meação pertencente à viúva do autor da sucessão. Da mesma forma, nos inventários feitos por escritura pública, as custas cartorárias não envolvem a meação e o imposto de transmissão “causa mortis” só pode incidir, e incide, exclusivamente, sobre o valor dos bens que compõem a herança, jamais abrangendo os bens que integram a meação do cônjuge sobrevivente. Como disse em meu livro Direito Hereditário do Cônjuge e do Companheiro (Editora Saraiva, SP, página 42), a meação não integra o direito sucessório, pois preexiste à morte, pertence ao cônjuge por direito próprio, é efeito do regime de bens do casamento. O cônjuge meeiro já é titular da metade ideal dos bens, já é meeiro e não se torna meeiro porque o outro morreu. No caso concreto, acima relatado, o imposto de transmissão “causa mortis” só vai incidir sobre o valor da herança deixada por José A. Barata, ou seja, a respeito de R$600.000,00, que cabem aos três filhos ou herdeiros do falecido. O tributo não incide sobre os R$ 600,000.00, que não integram a herança, mas representam a meação da viúva, Maria da Glória, que já era e continua sendo dela. 09.12.2013 |
Fonte: Jornal O Liberal - Edição de 25.02.2012 |
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