partilha  em  vida

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ZENO VELOSO
Jurista 

Recebi de Gen - Grupo Editorial Nacional, que reúne algumas editoras, dentre as quais a Método, de meu amigo Vauledir Santos, de São Paulo, que acompanho desde os primeiros passos e vaticinei seu crescimento e sucesso - a nova edição do curso completo de “Direito Civil” dos jovens e talentosos autores Flávio Tartuce e José Fernando Simão, ambos doutores pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo - USP, professores de várias instituições, autores de importantes obras jurídicas e membros do Instituto Brasileiro de Direito de Família. Tive a honra de prefaciar o volume que escreveram a respeito do Direito das Sucessões, logo no começo da carreira deles, e a obra é, hoje, considerada uma das mais importantes da literatura especializada de nosso país. São dois juristas de grande mérito.

Nesse aludido livro, Tartuce e Simão abordam, com propriedade, o importante tema da partilha em vida, que, como tantos outros, é pouco conhecido e escassamente utilizado no Brasil, apesar de sua evidente conveniência e vantagem.

Recentemente, no cartório em que atuo, fui procurado por um casal que é proprietário de muitos imóveis,  inclusive, fazendas no sul do Pará, e seus quatro filhos já estão demonstrando que vão se desentender e brigar bastante quando os pais morrerem e tiver de ser feito o inventário e a partilha dos bens.

Sugeri que outorgassem, desde logo, uma doação a esses filhos, como adiantamento de suas legítimas, isto é, uma antecipação do que iriam receber apenas com o falecimento dos ascendentes. Para segurança, os pais reservariam o usufruto dos imóveis, enquanto vivessem. 

O que torna dispendiosa essa doação é que precisa ser pago o imposto de transmissão, que, por ser ato gratuito, é tributo estadual, não municipal, e a alíquota é de quatro por cento.

Apesar de tudo, essa partilha em vida, além de prever e remediar questões e problemas futuros, sai muito mais em conta do que se tem de gastar para fazer um inventário e partilha dos bens somente depois da morte dos proprietários. 

Hoje, o problema está diminuído, diante dá possibilidade de o inventário ser feito por escritura pública, em cartório de notas. 

Já o inventário judicial, historicamente, é um verdadeiro calvário, em que se gastam anos e anos para que chegue ao fim, gerando uma despesa enorme, para não falar na ansiedade, na angústia que sempre gera a questão que demora muito, cuja solução leva uma eternidade.

Constitui a partilha em vida, segundo Simão e Tartuce, uma forma de partilha feita por ascendentes a descendentes, por ato entre vivos (doação) ou de última vontade (testamento), abrangendo seus bens de forma total ou parcial, desde que respeitados os parâmetros legais (caso da reserva da legítima dos herdeiros necessários), bem como o  mínimo para que o estipulante viva com dignidade. 

Não pode uma pessoa doar tudo o que possuiu e ficar na miséria, dependendo do reconhecimento ou da boa vontade dos donatários para sobreviver. Ai de quem espera a gratidão do que foi favorecido! 

Em versos imortais, o poeta Augusto dos Anjos adverte que a ingratidão é uma pantera, e que a mão que afaga é a mesma que apedreja. Meu talentoso amigo Jorge Arbage, que conhece de “cor e salteado” a obra do grande poeta paraense (mas nascido no Espírito Santo) Rodrigues Pinagé, costuma recitar um poema de Pinagé que diz: “Honra, moral, predicados, virtude, glória e talento, tudo jaz carbonizado na forja do esquecimento”.

No “Código Civil Comentado” (Editora Saraiva, 8ª edição, obra coletiva, coordenada originariamente por Ricardo Fiuza, página 2221), escrevi sobre o assunto, interpretando o artigo 2.018 do Código Civil. Disse que a partilha feita pelo ascendente por ato entre vivos chama-se partilha-doação.

A divisão entre os herdeiros tem efeito imediato, antecipando o que eles iriam receber apenas com o falecimento dos ascendentes. Como já adverti, a matéria é de grande importância. Precisa ser mais divulgada. Sua utilização é de enorme serventia. Ainda voltarei ao tema, neste espaço.

28.05.2012 

Fonte: Publicado no jornal "O Liberal" -  17.03.2012 

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