A TUTELA JURISDICIONAL ANTECIPADA: UMA
ANÁLISE CRÍTICO -REFLEXIVA |
JOSÉ OTÁVIO TEIXEIRA DA FONSECA
Advogado em Belém- Pará
Do mesmo autor: MOROSIDADE DO JUDICIÁRIO
"Causa
espécie a passividade e o temor de muitos juízes diante de pedidos de
concessão de tutela antecipada. Estes magistrados, ao que parece, ainda não
compreenderam com exatidão a essência desse novel instituto processual e
utilizam, invariavelmente, o perigo da irreversibilidade e a idéia
equivocada de faculdade judicial, como desculpas para uma grave omissão,
deixando de conceder desde logo o que será reconhecido ao final, com a
sentença, penalizando, assim, injustamente aquele que tem razão na
causa, com a notória e excessiva morosidade na entrega da prestação
jurisdicional." A
proposta deste estudo é apresentar uma análise crítico-reflexiva sobre
um instituto muito em voga nos meios jurídicos contemporâneos, concebido
na esteira dos ventos renovatórios processuais: o instituto da tutela
antecipada e o seu vínculo com o princípio da efetividade processual. Num
primeiro momento, paga a pena registrar que a tutela jurisdicional vem a
ser o poder-dever que tem o Estado de solucionar os conflitos
intersubjetivos, sendo tal encargo cumprido por juízes. Tal função é
exclusiva ou monopólio do Estado que, via Poder Judiciário, aplica a lei
ao caso concreto, solucionando os litígios que lhes são apresentados. Assim
sendo, o instituto da tutela antecipada revela-se como uma forma especial
de tutelação de interesses dentro de uma relação processual,
situando-se entre as fases postulatória e saneatória. Antes de
realizarmos uma análise crítico-reflexiva sobre o novel instituto
processual e o seu vínculo com o princípio da efetividade processual,
convém fornecer uma visão orgânica sobre o tema, o que faremos em rápidas
pinceladas. CONCEITO O
art. 273 do CPC nos induz a asseverar que a tutela antecipada vem a ser
uma antecipação dos possíveis efeitos da sentença que será proferida
ao final, ocasião em que é julgado, em termos definitivos, o mérito da
causa, extinguindo-se o processo com apreciação da lide. Não
é, portanto, como muitos confundem, julgamento antecipado da lide, por
que aqui há extinção do processo e ali não (art. 273, § 5º, CPC.
"Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo
até final julgamento.") NATUREZA
JURÍDICA Neste
tópico, cabe responder a seguinte indagação: qual a natureza jurídica
da decisão que concede a tutela antecipada? A
decisão antecipatória tem natureza jurídica de execução lato sensu,
pois visa a entrega antecipada ao autor da própria pretensão deduzida em
juízo ou os seus efeitos, tendo a decisão que a concede a natureza
constitutiva ou condenatória. Sobre
a questão, o § 3º do art. 273, afasta qualquer dúvida, quando
determina expressamente que à execução da tutela antecipada
observar-se-á, no que couber, os mesmos princípios que regem a execução
provisória da sentença. Portanto,
a antecipação não é propriamente do provimento judicial em si, no
sentido de definir a relação jurídica, mas dos efeitos que lhe são próprios,
sejam eles principais ou acessórios, sem prejuízo do direito em sua essência. OBJETO O
objeto da tutela antecipada vem a ser o mesmo objeto-direito alegado pelo
autor nos termos iniciais da exordial da relação processual. CARACTERÍSTICAS a)
Caráter interlocutório: uma das características da tutela antecipatória
é que ela tem a natureza de decisão interlocutória, consoante dispõe o
§ 5º do art. 273, uma vez que ocorre antes da prolação da sentença,
portanto, antes do julgamento final da lide, decidindo apenas uma questão
incidente sem, entretanto, pôr fim à relação processual. Sendo,
como é, decisão interlocutória, pode ser atacada mediante agravo,
conforme preleciona o art. 522, CPC. b)
Caráter provisório e satisfativo: A
tutela antecipada tem caráter provisório na medida em que seus efeitos
perduram até que, com o trânsito em julgado da sentença final,
tornam-se os mesmos definitivos ou são eles cassados, conforme seja
julgado procedente ou improcedente o mérito da causa, ressalvando-se
ainda que a antecipatória pode ser, mediante decisão fundamentada,
revogada ou modificada a qualquer tempo, consoante dispõe o § 4º, 273,
CPC. O
caráter satisfativo resulta do fato de que, com a antecipatória, o Poder
Judiciário concede desde logo, ainda que provisoriamente, o
objeto-direito perseguido pela parte na relação processual, o que
constitui o escopo e a natureza jurídica deste novel instituto
processual. REQUISITOS São
os pressupostos indispensáveis exigidos pela lei a validade da concessão
da tutela antecipada. São eles: a)
Prova inequívoca: é a prova séria e robusta que não permite dúvidas
ou equívocos quanto ao direito alegado. b)
Verossimilhança: é a preponderância ou inclinação, no sentido de se
tomar por críveis os fatos alegados. c)
Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação: é o
periculum in mora, caracterizado pelo fundado temor de perecimento do
direito pelo qual se está litigando, em razão da morosidade na entrega
da prestação jurisdicional. PROCEDIMENTO a)
legitimação – Quem tem legitimidade para requerer a tutela antecipada?
Segundo a lei e a doutrina majoritária, têm legitimidade para interpor
pedido de concessão de antecipatória o autor, o Ministério Público e o
terceiro interveniente, ressalvando-se que a antecipatória poderá ser
concedida também ao réu se esta tiver sido requerida em reconvenção, ação
declaratória incidental e na contestação das ações dúplices. b)
Pedido – o pedido de concessão da tutela pode ser feito a qualquer
momento, da petição inicial até antes do julgamento final da lide, em
petição própria e dentro dos autos do processo. Ressalte-se que não
será concedida a antecipação da tutela por decisão ex officio, uma vez
o art. 273, caput, exige expressamente que a parte a requeira. Digno
de registro é que o pedido de concessão pode ser formulado logo na
inicial, uma vez presentes os requisitos do caput e seu inciso I e do § 2º
ou após a contestação, desde que presentes os requisitos do inciso II e
do caput do art. 273, exigindo-se também o pressuposto do § 2º do
aludido dispositivo do CPC. TUTELA
ANTECIPATÓRIA E TUTELA CAUTELAR – DISTINÇÕES Inobstante
apresentarem um ascendente comum – a provisoriedade – tutela
antecipada e tutela cautelar são inconfundíveis, uma vez que aquela é
uma forma especial de tutelação de interesses, caracterizando-se
especialmente pela antecipação dos efeitos da sentença, possuindo
natureza jurídica de execução lato sensu, e tendo por objeto o mesmo
objeto-direito alegado pelo
autor na peça vestibular. A tutela cautelar, por seu turno, é destinada
a assegurar a efetividade do resultado final do processo principal, sendo
desprovida do caráter satisfativo que é a característica fundamental da
antecipatória; AS
CARACTERÍSTICAS DA TUTELA ANTECIPADA SÃO AS SEGUINTES: a)
é uma decisão de natureza interlocutória, pois é incidental e não
extingue processo; b)
é de caráter provisório e satisfativo – provisória por que pode ser
revogada ou modificada a qualquer tempo, inclusive na sentença final; c)
apresenta forma ampla – podendo ser concedida total ou parcialmente
dentro do poder discricionário do magistrado, é um ato judicial que deve
apenas se revestir do requisito da fundamentação para a sua concessão,
exigência expressa nos arts. 93, IX, da Carta Federal e arts. 131 e 458
do CPC, vez que a ausência de fundamentação na decisão que concede a
antecipatória a expõe a nulidade. ANÁLISE
CRÍTICO-REFLEXIVA DO INSTITUTO Pelo
visto acima, a tutela antecipada evidencia-se como um instituto de
fundamental importância para viabilizar a urgente necessidade de agilizar
a prestação da resposta jurisdicional, com a entrega do direito a quem
realmente tem razão na relação processual, buscando, assim, equacionar
o princípio da efetividade processual com a questão da segurança jurídica.
Entretanto,
no cotidiano forense, causa espécie a passividade e o temor de muitos juízes
diante de pedidos de concessão de tutela antecipada. Estes magistrados,
ao que parece, ainda não compreenderam com exatidão a essência desse
novel instituto processual, e, utilizam, invariavelmente, o perigo da
irreversibilidade e a idéia equivocada de faculdade judicial, como
desculpas para uma grave omissão, deixando de conceder desde logo o que
será reconhecido ao final, com a sentença, penalizando, assim,
injustamente aquele que tem razão na causa, com a notória e excessiva
morosidade na entrega da prestação jurisidicional. Sobre
a questão, paga a pena transcrever a lúcida advertência de Carreira
Alvim (Antecipação da Tutela. In Código de Processo Civil Reformado, 3ª
ed., revista e ampliada, BH, Del Rey, 1996, p. 103): "Como
a concessão do provimento jurisdicional não é uma graça do Estado, mas
um direito da parte, preparem-se juízes e tribunais para o exercício de
sua nobre missão de outorgar tutela na forma da lei, não devendo o termo
poderá ser entendido como um passaporte para a omissão, deixando para a
sentença o que, segundo a lei, deva ser, de logo, antecipado." Ora,
se o advento do aludido instituto teve como escopo apaziguar a inquietude
vigente na sociedade, aturdida e perplexa diante da morosidade do Poder
Judiciário em solucionar com maior agilidade os conflitos intersubjetivos
que se arrastam insolúveis, aos juízes e tribunais cabe a
responsabilidade de, na medida de seu poder discricionário, viabilizar a
adequada e oportuna outorga da tutela antecipada quando presentes os
requisitos exigidos na lei, pois, do contrário, de nada terá adiantado,
então, o advento desse instrumento para garantia da efetividade
processual. Ademais,
com a utilização da antecipatória, ficam reduzidas significativamente
as chances de se cometer uma injustiça em função do transcurso do
tempo, sempre benéfico a quem não tem razão e uma penalidade severa e
injusta para aquele que a tem. Ressalte-se ainda que a própria morosidade
na solução da lide coloca em xeque a capacidade do Judiciário de agir
na conformidade de seus deveres constitucionais, levando-o ao descrédito
perante a sociedade. Sobre
o tema, ensina-nos Luiz Guilherme Marinoni in Tutela Antecipatória,
Julgamento Antecipado da Lide e Execução Imediata da Sentença, São
Paulo, Revista dos Tribunais, 1997, p. 19 e 23: "Se
o tempo é a dimensão fundamental da vida humana e se o bem perseguido no
processo interfere na felicidade do litigante que o reivindica, é certo
que a demora do processo gera, no mínimo, infelicidade pessoal e angústia
e reduz as expectativas de uma vida mais feliz (ou menos infeliz). Não é
possível desconsiderar o que se passa na vida das partes que estão em juízo.
O
cidadão concreto, o homem das ruas, não pode ter os seus sentimentos, as
suas angústias e as suas decepções desprezadas pelos responsáveis pela
administração da justiça." E
arremata ainda o mesmo autor: "Se
o processo é um instrumento ético, que não pode impor um dano à parte
que tem razão, beneficiando a parte que não a tem, é inevitável que
ele seja dotado de um mecanismo de antecipação da tutela, que nada mais
é do que uma técnica que permite a distribuição racional do tempo do
processo". Portanto,
conclama-se juízes e tribunais à utilização do novel instrumento
processual com coragem, bom senso, racionalidade e comprometimento com o
bem social, justificando, assim, o seu advento, e tornando mais ágil o
processo e impedindo ou, pelo menos, atenuando, os efeitos nefastos da ação
do tempo quanto ao objeto em questão na lide, evitando que a parte que não
tem razão tripudie sobre a que merece, sem delongas, a tutela para o seu
direito violado ou ameaçado de lesão. Esse é o desafio! 30.01.2008 |
Fonte: Remetido por e-mail |
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