UNIÃO ESTÁVEL - PRAZO - HOMEM CASADO |
Zeno Veloso
Jurista
O namoro de João Alberto com Flaviana durou mais de dez anos. O casamento
deles não chegou a festejar o terceiro aniversário. Estão separados de
fato, depois de uma fase difícil de ciúmes intermináveis, suspeitas recíprocas,
discussões quase diárias. Enfim, a rotina, que os dois não conseguiram
superar e remediar, consumiu a paixão, e a convivência passou a ser uma
chatice.
Flaviana voltou a morar com os pais, e João alugou um pequeno
apartamento. Ambos são empregados, têm renda para a própria subsistência,
não dependem em nada um do outro e, assim, vão levando suas vidas, na
busca de um novo encontro e, quem sabe, da felicidade. Tecnicamente, estão
separados de fato e não de direito, porque não promoveram judicialmente
a sua separação.
Numa festa de formatura, João se encantou com a irmã de uma das
colandas, de nome Jussara Maria, e passou a namorar com ela. Com menos de
sete meses, os dois já estavam dividindo o apartamento do rapaz. A convivência
dura mais de dois anos.
O pai de Jussara é empregado de confiança de uma conceituada e antiga
empresa, sempre teve contactos com advogados, contadores, é homem de
larga experiência e conhecimento, embora não tivesse tido oportunidade
de cursar uma faculdade. Está preocupado com o fato de João jamais ter
tomado a iniciativa de legalizar a sua separação com Flaviana e nunca
mencionar a palavra casamento com Jussara, que, por sua vez, largou os
estudos e se desinteressou por uma boa proposta de emprego na própria
firma em que o pai trabalha, alegando que queria dedicar todo o seu tempo
ao 'marido' e às inúmeras tarefas de 'dona de casa'. Enfim, o pai da moça
não sabe, exatamente, que tipo de relação está mantendo Jussara com João
Alberto: ela é namorada dele? Concubina? Companheira? Tem algum direito?
Pode pedir pensão alimentícia, se o envolvimento afetivo acabar?
Um amigo do pai de Jussara, que disse haver estudado o caso, trouxe a
seguinte solução: Jussara está envolvida com um homem casado, portanto,
em prática de adultério. Seu relacionamento é impuro, e não passa de
concubinato. Não sendo uma união estável, que pressupõe cinco anos de
convivência, Jussara está desprotegida; não tem direito a nada e coisa
alguma.
Foi pedida minha opinião, que dei e repasso aos leitores. Em primeiro
lugar, a lei não fixa um prazo certo, rígido, determinado, para que um
relacionamento adquira status de entidade familiar. A Lei nº 8971, de 29
de dezembro de 1994, previa o prazo de cinco anos para que uma união estável
se estabelecesse. Esta lei, porém, já esta revogada. Atualmente, este
assunto vem tratado no Código Civil, arts. 1.723 a 1.727. A união estável
é uma entidade familiar entre o homem e a mulher, configurada na convivência
pública contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição
de família.
Não há um prazo pré-estabelecido de convivência, mas, é claro, o
relacionamento para se transformar em entidade familiar, tendo de ostentar
os requisitos da publicidade, continuidade e durabilidade, precisa durar
algum tempo, e isso será aferido pelo juiz em cada caso concreto,
considerando as circunstâncias do mesmo, inclusive, a existência de
prole.
Não é bastante que vivam juntos: um homem e uma mulher podem se
relacionar por muitos anos, mais de cinco ou mais de dez anos, sem que aí
se crie uma união estável. É essencial que, além dos requisitos
objetivos, haja o pressuposto subjetivo, moral, psicológico: a vontade de
constituir uma família. O homem casado, em princípio, não pode constituir uma união estável com outra mulher, as relações que ele mantém fora do lar são pecaminosas, ilícitas, adulterinas, constituindo concubinato, que outrora se chamava concubinato impuro. Todavia, conforme prevê o art. 1.723, parágrafo primeiro, do Código Civil, se a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente, passando a conviver afetivamente com outrem, esse relacionamento pode constituir uma união estável, se os requisitos desta estiverem cumpridos. 30.04.2006 |
Fonte: Jornal O Liberal - Edição de 29.04.2006 |
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