união estável seguida de casamento |
Zeno Veloso
Jurista
Cada
convivente tem mais de 60 anos, e vida em comum há 25 anos. A idéia
partiu dos filhos, e a família resolveu que devia ser celebrado o
casamento dos dois com uma grande festa. Rodolfo e Marilda - assim se
chamam - começaram a viver juntos e jamais se casaram. O varão era viúvo,
a moça solteira, mas, por diversas razões, até de foro íntimo, adiaram
o casamento formal. Todavia - e sem dúvida alguma -, constituíram uma
família, com a maior dignidade, alicerçada no afeto, na confiança, na
convivência prolongada. Uma família igual em direitos e obrigações às
famílias que se fundaram no casamento. Rodolfo e Marilda vivem numa união
estável, para utilizar a expressão que a Constituição de 1988
consagrou e é mencionada no artigo 1.723 do Código Civil vigente.
Tiveram três filhos. Entretanto,
foram alertados de que seu casamento obedeceria, obrigatoriamente, ao
regime da separação de bens, pelo fato de cada um dos nubentes ter mais
de 60 anos de idade - e bastava que um deles já tivesse essa idade para
que tal regime fosse aplicado. O art. 1.641 do Código Civil aponta as hipóteses
em que o casamento será pelo regime da separação de bens, daí ser
chamado de separação cogente ou obrigatória. Meu saudoso mestre Silvio
Rodrigues já apontava, pioneiramente, que essa restrição se mostrava
atentatória à liberdade individual, e que a tutela do Estado, nesse
caso, era excessiva, descabida, injustificável. O professor Paulo Luiz Maria
Berenice Dias, Érika Canuto, Rodrigo da Cunha Pereira e outros autores
afirmam que o art. 1.641, II, do Código Civil fere princípios
constitucionais. Entretanto, uma lei não é inconstitucional apenas
porque muitos juristas assim opinam; uma lei só é inconstitucional
quando o Judiciário afirma e decide que é. O problema, no caso de
Rodolfo e Marilda, é que, durante a convivência, compraram vários imóveis
e constituíram uma empresa. Pelo regime de bens que se aplica à união
estável, o da comunhão parcial, esses bens são comuns, vale dizer, de
propriedade do companheiro e da companheira, embora quase todos tenham
sido adquiridos apenas em nome do varão, como é praxe num país ainda
machista como o nosso. E surge a dúvida: se eles vão casar pelo regime
(obrigatório) da separação de bens, e como quase todos os bens estão
em nome de Rodolfo, Marilda vai ficar sem nada? A meu ver, as situações são bem distintas: uma, anterior ao casamento, em que existia a união estável, e o eegime era o da comunhão parcial de bens; outra, posterior ao casamento, em que vigora a separação obrigatória, ou seja, apenas os bens que forem adquiridos depois do casamento é que seguem o regime da separação. A situação outrora existente tem de ser resguardada, protegida, pois representa direito adquirido, e eu abordei recentemente esta questão em meu livro de comentários à Lei de Introdução ao Código Civil. 09.01.2007 |
Fonte: Jornal O Liberal - Edição de 10.06.2006 |
www.soleis.adv.br Divulgue este site