PRONÚNCIA - HOMICÍDIO - TORPE
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PROC. nº 00/96 – PRONÚNCIA  

Vistos etc... 

01.     PINHEIRO ..., já qualificado nos autos, foi denunciado pela ilustre representante do Ministério Público, com exercício perante este Juízo, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 121 (homicídio), parágrafo 2º (homicídio qualificado), inciso I (mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe), do Código Penal, argumentando que: a) “no dia 29 de novembro de 1995, por volta das 07:00 horas, o denunciado, usando de uma espingarda calibre “32”, de marca “Rossy”, desfechou tiros no Sr.  FERREIRA ..., que após atingido pelo projétil, veio a falecer.” b) “que antes do fatídico acontecimento existia entre a vítima e o denunciado um conflito em razão da disputa de terras em que o Sr. Lauro dos Santos Ferreira, vinha cultivando e onde o acusado, também, pretendia fazer roçado, cujo problema levou a vítima a promover queixa na Delegacia de Polícia deste Município;”  c) “que no dia do crime o denunciado dirigiu-se ao local do plantio e palco do crime, e constatou que um material de sua propriedade e que se destinava à construção de um curral havia sido danificado, atribuindo a responsabilidade do fato à vítima, razão pela qual retornou até a sua residência, localizada em terreno confinante com o do ofendido e. ali, armou-se de uma espingarda, antes municiando-a, voltando em seguida para o plantio, local onde tinha certeza que se encontraria com o seu desafeto, posto que no caminho de volta a sua casa viu quando  o  mesmo  para  ali  se  dirigia;”  d) “Confrontando-se com a vítima, travou com a mesma calorosa discussão, culminado em disparar contra a mesma a arma de fogo, produzindo-lhe lesões descritas no laudo de fls. 47 dos autos, sendo correto afirmar, ainda, que o denunciado não somente atirou contra a vítima, como, também, desferiu-lhe terçadadas, haja vista que as lesões demonstradas as fls. 48 são sugestivas de defesa, ocasionadas certamente quando a mesma tentava aparar os golpes de ataque do acusado;”  e) “Apesar de que o  denunciado alega o reverso de tal situação, buscando acobertar-se pelo manto da legítima defesa, dizendo ter sido vítima de terçadadas aplicadas pelo Sr.  Ferreira durante aquela contenda, verdadeiramente as lesões descritas pelo laudo inserido às fls. 49 não conduzem a esse entendimento, posto que acusam regeneração de escoriações produzidas por ação contundente, daí quedar-se por prejudicada tal alegativa, estando sobejamente provado, conforme se extrai de suas próprias declarações, que agiu premeditadamente, assim como evidenciado está que disparou a espingarda já distante da vítima, conforme afirma a perícia médico legal”. 

02.     A denúncia, acompanhada do rol de testemunhas e dos autos do inquérito policial, foi recebida em 03.maio.1996, quando foi determinada a citação do réu e designada a audiência para o seu interrogatório. 

03.     Regularmente citado, e tendo comparecido em Juízo e sido interrogado (fls. 93/95), o réu alegou que  é verdadeira a imputação que lhe é feita pelo Órgão Ministerial, pois realmente matou a vítima, porém alega que se assim não agisse seria fatalmente morto pela vítima; que já existia uma certa animosidade entre o acusado e a vítima há cerca de 04 anos: que tal divergência começou quando o acusado tentou fazer sua casa em um terreno que se localizava entre a casa de seu pai e a casa da vítima.”. 

04.     A defesa, no prazo legal,  declinou da apresentação de defesa prévia, mas arrolou testemunhas (fls. 98), reservando-se para manifestação de mérito na ocasião oportuna.  

05.     O processo teve seu curso normal e, no sumário de culpa, foram inquirição as testemunhas Maria ... ( fls. 108),  Diniz ..., (fls. 109),  Elleres ... (fls. 109) e  Gama  (fls. 124), arroladas pela acusação e, Francisco  (fls. 125), Pinheiro (fls. 126) e Mário  (fls. 128) que substituiu  Lúcio , por ter falecido, arroladas pela defesa. 

06.         Em alegações finais de fls. 131, a acusação, argumentando com base na doutrina e jurisprudência, diz  estar claro que o denunciado PINHEIRO, com a sua conduta, praticou o crime de homicídio qualificado; ratificou os termos da denúncia e de todas as provas produzidas, a fim de que seja o réu pronunciado nas penas do crime de homicídio qualificado por motivo torpe (art. 121, § 2º, I do Código Penal), para posteriormente ser julgado por um Tribunal do Júri. 

07.             A defesa,  nas alegações finais,  afirma não haver elementos probantes que possam sustentar a denúncia, face a perfeita caracterização da dirimente da legítima defesa, esperando ser absolvido da acusação inicial, vez que o defendente estava trabalhando em área pertencente a comunidade, limítrofe à área da vítima, quando foi injustamente agredido por esta que lhe aplicou várias rimpadas com terçado, cujas lesões constam do laudo pericial de fls. 53; que a vítima fincou o terçado no chão e armou-se com sua cartucheira para atirar no acusado e este, para não ser morto, em um gesto legítimo de defesa, fez uso de sua arma, atirando a esmo, vindo a atingir a vítima, que morreu; que apresentou-se espontaneamente e sozinho à autoridade policial; que se está diante de caso de defesa legítima própria; que a agressão da vítima era atual e injusta; que os meios usados pelo réu estavam cobertos pela moderação; que estão presentes todos os requisitos que a lei exige para configuração da legítima defesa; que nenhuma prova foi produzida na instrução, para colocar em dúvida as declarações do denunciado; que as palavras da mulher da vítima não estão dotadas de credibilidade, vez que apresentou 4 versões diferentes para o mesmo fato; que seja acolhida a excludente invocada para absolver o réu sumariamente, nos termos do art. 411 do Código de Processo Penal, a fim de ser feita Justiça diante do caso concreto. 

        É O RELATÓRIO. DECIDO. 

08.     O art. 408 do Código de Processo Penal estabelece que o Juiz pronunciará o réu quando se convencer da existência do delito e houver indícios de ser ele o seu autor. 

09. Na decisão de pronúncia é vedada ao Juiz a análise aprofundada do mérito da questão, tendo em vista ser atribuição dos integrantes do Conselho de Sentença do E. Tribunal do Júri julgar, por força de preceito constitucional. 

10.     Inobstante essa vedação, a fundamentação é indispensável, conforme preceitua o mesmo dispositivo, daí a circunstância de discorrer sobre os elementos contidos nos autos. 

11.     A materialidade do delito está contida no exame de corpo de delito-relatório de necrópsia médico-legal de fls. 50/52. 

12.     O réu, ao ser interrogado, confessou que “desferiu o tiro na vítima” (fls. 94); “que apertou o gatilho de sua espingarda e em seguida viu o Ferreira cair junto com sua espingarda; “que após atirar no Lauro o declarante ficou muito assustado e fugiu do local, embrenhando-se nas matas” (fls. 18), embora procurando dar uma versão que o favorecesse. 

13. O depoimento das testemunhas a seguir apontam o réu como autor do fato, senão vejamos: A testemunha Maria afirmou “ que ouviu apenas uma discussão entre o seu esposo e o citado elemento conhecido como “Bacú”; “de longe ainda gritou para que eles parassem a discussão e ao se aproximar a depoente ouviu um tiro vindo de dentro do roçado; “com dificuldades apressou os passos para o rumo de onde veio o tiro, neste momento passa correndo ao seu lado o elemento Reginaldo, vulgo “Bacú”. (fls. 13). 

14.     A testemunha Mário , declarou que “Maria José contou ao declarante e aos demais que logo após o tiro disparado por Pinheiro contra Ferreira, a esposa do Ferreira, Maria  tratou de esconder a espingarda que Ferrira portava no momento em que levou o tiro de Pinheiro” (fls. 31). 

15.     Através da provas apuradas, não encontro elementos que me convençam de ter o acusado agido em defesa de sua pessoa. 

16.     O cometimento do crime, motivado pelo cultivo de um roçado em local onde acusado e vítima pretendiam cultivar, leva à configuração da circunstância qualificadora do motivo torpe. 

17.     Assim sendo, atendendo ao que dispõe o art. 408 do Código de Processo Penal,  JULGO PROCEDENTE A DENÚNCIA, para PRONUNCIAR o réu PINHEIRO ..., como incurso nas penas do art. 121, § 2º, inciso I, do Código Penal, sujeitando-o ao julgamento pelo Egrégio Tribunal do Júri. 

18.     Em respeito ao princípio da inocência, deixo de terminar-lhe o lançamento do nome no rol dos culpados. 

19.     Considerando que o réu não registra antecedentes criminais (fls. 99-v e 157); é réu primário (fls. 158); possui residência fixa; encontra-se em liberdade; tem comparecido a todos os atos do processo e apresenta-se mensalmente em Juízo, com amparo no art. 408, § 2º do Código de Processo Penal, deixo de decretar-lhe a prisão. 

20.     Publique-se, intimem-se e registre-se. 

             São Caetano de Odivelas (PA), 30 de março de 1998. 

                    Carlos Alberto Miranda Gomes
                            Juiz de Direito – Presidente do
Tribunal do Júri   

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